29.12.05

... Três, dois, um: puf!

É o fim.

Festa de fim de ano dentro de casa anuncia o fim tempos, parece. Fim da paciência que nos esgotamos de treinar durante 12 meses, fim da esperança de não ver a prima velha das lentilhas voadoras, fim da vida curta da toalha que a mãe escondeu a vida toda dos nossos lanches da tarde. Tem fim pra tudo.

Mas tem começo também. É o sapateado das tias gordas pela cozinha: se esbarram, se pisam, se xingam. Fingem que estão ali para reparar a disposição dos pratos na mesa enquanto a gente... A gente finge que não as repara. Tremoço pra dentro, é o que resta.

"Ah, Fulaninho e Ciclana Beltrana foram pra Paulista ver a virada", berrou o Tio. Não pude mais pensar em outra coisa por várias horas, somente no acontecimento que deve ser assistir à virada na Paulista. Tanta coisa lá vira... E minha mente pobre ia enumerando invejosa... Viram-se latas, garrafas, garrafões e até barris de pura etilicidade goela adentro, é um "tsc ahhhhhh" e gargalhadas borbulham, não champagnes. Tem virada de pescoço pra abundância daquela gostosinha que passa... Olha lá, vem agora a virada de mão na cara do sujeito que ousou destacar a buchechuda na multidão! Eia, virou uma bola de gente se batendo... Tem quem não se propõem a acompanhar essa banda e vai virando a esquina da Haddock, ali sim tem um pega que vira de verdade, é, lá tem, vira o zóio. Tem o CNS ali que não gosta de ver os virados, melhor, os viados, reclama da indecência deles, "tão me virando a bunda", diz aos CNSs amigos. Mas é a noite da virada, porra, aguenta e se vira! Vai, exercício pro carnaval, data eleita pra virar o que quiser sem culpa... Mas com dor, né, quem vira sempre toma. E o que vira aquela avenida com tanta gente virada? É a redenção! Dia seguinte é só virar a cara e tá tudo bem, vai.

Tanta coisa virou em 2005 que virada no estômago por causa de festividades é pouca bucha. E na hora a gente se vira pra oferecer um belo novo ano, como sempre. Dali em diante, são muitos fogos, dentes, braços se emaranhando... A gente vira gente.


13.12.05

Livres

Parece um esboço de nada isso aqui, calma. Essa sua impaciência sempre me desconcentra... Devagar, tenta ditar pra mim de forma mais clara como quer que eu deslize agora, nem precisa fazer mais força. Desço a linha mesmo? Aqui tem espaço pra muita coisa ainda. Já sei, não é assim, mas eu não tô aqui pra que algo faça sentido, só pra dar forma aos seus estímulos. Não me interessa se não criam uma lógica pra você ou pra quem vai ler, me deixa cumprir meu ofício, vai.

Ontem chorei meus passos saindo daquela casa. Escorreram pelo assoalho do quarto, foram dar com o carpete verde da sala mas não se deixaram absorver ali. Preferiram o barro das ruas sem asfalto.


5.12.05

Naquela noite que selamos a nossa vontade de nos vermos maiores, o abraço longo de nossos corpos calou para sempre a voz de todos os dias. Nos silenciamos em protesto à ausência futura, a uma não-presença de nós em nós mesmos. Dali em diante, desnudos, secos, talhados.